quarta-feira, 31 de outubro de 2012

HOMEM PLURAL: Os determinantes da ação



                                                  Por:Maria do Socorro Rodrigues de Souza Aires *
Bernard Lahire (1963) é um sociólogo francês e professor na Escola normal superior de Lyon e diretor do Grupo de Pesquisa sobre a Socialização (CNRS). Dentre os seus estudos, destacamos a obra Homem Plural (2002) como importante referência teórica para as ciências sociais. Nesta resenha, tenho interesse em algumas colocações destacadas pelo autor  no tópico, Esboço para uma teoria do ator plural, em que propõem a não universalização dos achados científicos, a partir de uma reflexão crítica sobre as grande teorias sociais.
Lahire coloca em discussão as teorias da ação e do ator e afirma que há entre elas uma oposição que revela uma série de tensões interpretativas. A começar pelos termos que os autores usam pra designar “o homem nas formas de vida social”, o que também os relacionam a um determinado campo de pertença e seus adversários potenciais. Assim, nesta discussão ele utiliza o termo “ator”, tendo em vista que, o termo se relaciona a uma rede relativamente coerente de termos (p.10). Porém, o autor esclarece que a sua reflexão é direcionada para a “teoria da prática do habitus desenvolvidas por Pierre Bourdieu” e convidando-nos a “pensar com e contra” este autor, sem medo de exercer uma atividade crítica, tendo em vista, o resultado desta discussão (p.11).
Segundo o autor, o esboço da sua teoria do ator plural fundamentou-se em conhecimentos sociológicos, antropológico, históricos, filosóficos e psicológicos. Além de reflexões sobre as experiências literárias, sobre as práticas escolares e as práticas comuns da escrita ou ainda desenvolvidos relativos aos processos de incorporação. Lahire, descreve os elementos da sua teoria, a partir de cenas em que ele apresenta seus argumentos e desenvolve a reflexão a que se propõem. Desta forma, ele apresenta o ator plural na cena um, na cena dois ele indica os determinantes da ação, na cena três ele discute a analogia e transferência e, na cena quatro ele reflete sobre a experiência literária: leitura, sonho e atos falhos.
O ator plural
Neste ponto da obra, o autor faz uma comparação dos pólos do globo terrestre com o conjunto das teorias da ação. Para o autor, o conjunto das diversas teorias têm dois polos: um da unicidade e outro da fragmentação interna e a escolha de um, ou de outro pólo, “funda-se, em certos casos mais sobre pressupostos éticos do que em constatações empíricas” (p.17). Neste sentido, ele ilustra o pólo da unicidade com a teoria de habitus de Bourdieu e aponta que “esse exemplo, as vezes condensa ou cumula o conjunto das estatísticas mais ligada a um grupo social e é útil para demonstrar modelos macrossociológicos”. No entanto,  Lahire sugere que pode ser enganoso, quando tomado como um caso particular do real, devido a realidade do ator ser diferente, singular e enfatiza que as teorias da unicidade e da homogeneidade tanto da cultura como do ator não tem nenhuma evidência (p.20).
Lahire afirma que Goffman critica a teoria da unicidade sobre o ator, pois segundo ele, estas reúnem de certa forma as concepções comuns de si-mesmo e dão conta de uma maneira comum de focalizar a nossa percepção do outro. O autor questiona que assim, reconstituir o “estilo”, que perdura e se manifesta nos domínios mais diferentes de atividade, não é compartilhar a ilusão comum da unicidade e da invariabilidade? Neste sentido, ele enfatiza que Bourdieu tenta escapar das ideias de um eu reduzida, lembrando a construção social e literária representada pela “experiência comum da vida como unidade e totalidade”. Desta forma, o conceito de habitus (a sociologia) vem assim para não conceder nada ao empirismo em socorro de uma ilusão socialmente bem fundamentada, (senso comum). Segundo Goffman, isso pode cair numa espécie de empirismo radical que captaria apenas uma pulverização de identidade. O mesmo lembra a importância das perguntas que são de ordens para informar a sua identidade, a exemplo da carteira de identidade, onde o nome e sobrenome são os unificadores sumários da identidade pessoal (p.23).
Quanto às condições sócio-históricas da unicidade e da pluralidade, Lahire coloca que um ator portador de um sistema de dispositivos ou esquema homogêneos e coerentes, são necessárias condições socais totalmente particulares,que nem sempre são reunidas, ou se reúnem excepcionalmente Ele faz referência a Durkheim, quando este utiliza o conceito de habitus em duas situações históricas particulares: “as sociedades tradicionais” e o “regime de internato”, o primeiro caso, ele destaca o menor desenvolvimento das individualidades,e o aspecto mais fraco do grupo, é a homogeneidade das circunstâncias exteriores, tudo é comum a todos. Neste sentido, percebe-se a importância que Bourdieu deu ao trazer o conceito de habitus para capturar justamente o funcionamento de uma sociedade tradicional. A saber a sociedade cabila (p.24).
No segundo caso Durkheim emprega termo habitus a propósito da educação cristã como envolvimento da criança inteira, cuja influência é única e constante. Segundo o autor, o habitus em Durkheim corresponde ao internato que Goffman vem dizer que é “mundo total de sentido” modelo de comunidade indiferenciada, pelo fato de estar incrustada numa sociedade com forte diferenciação. Segundo Durkheim, os indivíduos só podem ter disposições socais gerais, concretas transponíveis de uma esfera de atividade a outra ou de uma prática a outra, somente se suas experiências sociais forem sempre governadas pelos mesmos princípios (p.25)
O texto também apresenta que Bourdieu inspirou-se amplamente na sociologia implícita de Panolsky para explicar e fortalecer a sua teoria do habitus, mas não acentuou a excepcionalidade do contexto histórico estudado, se o tivesse feito, sem dúvida teria tido que relativizar a unicidade e durabilidade e a transponibilidade dos esquemas ou das disposições constituintes do hábito. Para o autor, a coerência dos hábitos ou esquemas de ação que cada ator pode ter interiorizado é muito relacionado com a coerência dos princípios de socialização aos quais esteve sujeito, ou seja, todo corpo (individual) envolvido numa pluralidade de mundos sociais está sujeitos a princípios de socialização heterogêneos e, às vezes contraditórios que incorpora (p.31).
Lahire coloca que a socialização de um ser humano se forma por diferentes  repertórios de hábitos que não são equivalentes e por isso separados em contextos sociais diferenciados, assim, segundo ele em certos universos sociais é possível ser “consumidor”, enquanto em outros são produtores e profissionais. O ator afirma que estes contextos de interação se manifestam sob forma de campos, mas não necessariamente na perspectiva que Bourdieu imprime a estes (de lutas e de forças), pois nem todo interação social, nem toda situação social, pode ser atribuída a um campo.
 Ele afirma que certos campos são subcampos de outros campos, são construções científicas de uma realidade que não coincide com os cortes feitos para constituir outros campos. Para ele, tanto um objetos, quantos pessoas físicas podem pertencer a vários campos, assim como, muitos atores sociais estão fora de campo, imersos num grande “espaço social”. O autor aponta que há pouco interesse em compreender a vida fora de cena ou fora de campo dos produtores de campo (p.34). Ele menciona que a teoria dos campos é útil para uma série de questões científicas, mas cria outras problemáticas, sendo portanto, uma teoria regional do mundo social. O autor afirma que não se pode reduzir os atores aos seus habitus de campo, na medida em que suas expectativas vão além daquelas que podem viver no âmbito de um campo, pois um ator plural é produto da experiência de socialização em contextos sociais  múltiplos e heterogêneos (p.35/6).
Neste sentido, na cena dois em que apresenta os determinantes da ação e diz que pode-se distinguir duas grande tendências entre as teorias da ação e do ator. Lahire aponta que de um lado estão os modelos que conferem um peso determinante ao passado do ator e de outro estão os modelos que não levam em consideração o passado do ator, mas o momento de uma interação ou situação. Para ele esses modelos, ambos produzem conhecimentos sobre o mundo social, mas os seus estudos não se inscrevem nesta perspectiva (p.47). Segundo o autor, a questão do peso relativo das experiências e da situação presente para explicar as ações está fundamentalmente ligada à questão da pluralidade interna do ator, relacionadas a pluralidades das lógicas de ação as quais o ator é evado a sei inscrever.
 O autor afirma que a ação é sempre o ponto de encontro das experiências passadas individuais que foram incorporadas sob forma de esquemas de ação, de hábitos, de maneiras e de uma situação social presente. O passado incorporado pelo presente, mobiliza esquemas da experiência passada e o papel da analogia prática é muito importante, pois o raciocínio prático pode muito bem  negligenciar certos traços da situação e reter apenas um esquema relacional geral (p.69). Desta forma, Lahire afirma que o processo de transferência analógica, continua sendo usado pelos sociólogos com recursos expliar o funcionamento cognitivo sensório-motor, apreciativo, emocional, etc. Porém, trata-se de uma transferência limitada e condicional (condicionada por situações sociais).
Lahire, ainda analisa o aspecto da experiência literária: a leitura, sonhos e atos falhos. Para este autor, o sentido das leituras, as experiências que os leitores vivem om seus livros, são questões que os sociólogos praticamente deixaram de lado. O autor afirma que a leitura como experiência social não é aquela considerada a partir de uma sociologia do consumo cultural, mas como elemento da teoria da ação tal qual o autor concebe. Ele afirma que os textos literários permitem fazer uma volta a, prolongar, acompanhar ou prolongar a ação, pois a situação de leitura, é um quadro social, um contexto social que aproxima, assim, a sociologia das sensibilidades literárias de uma sociologia dos sonhos despertos e, afinal de contas de uma sociologia da ação.

LAHIRE, Bernard. HOMEM PLURAL: Os determinantes da ação. Tradução. Jaime A. Clasen. Petropólis, RJ: Vozes, 2002.

*Possui bacharelado em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Maranhão (2008) e Licenciatura em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Maranhão (2008). Especialização em Educação Inclusiva pela Universidade Estadual do Maranhão (2011). Tem experiência com docência do ensino superior pela Universidade Estadual do Maranhão, onde exerceu a função de professora substituta pelo Programa Darcy Ribeiro atuando na rota Campos. Além de ter partcipado como tutora das disciplinas Metodologia de Pesquisa em Educação e Antropologia no curso de Pedagogia à distância (UEMANET). Tem experiência em Metodologia de Pesquisa Científica, na área de Antropologia, com ênfase em Antropologia das religiões afro-brasileiras, atuando principalmente nos seguintes temas: tambor de mina, rituais religiosos, religião afro-brasileira, Terreiro Fé em Deus, festas populares e Sociologia da Educação.








terça-feira, 30 de outubro de 2012

Jornada de Reflexión y Debate


Jornada de Reflexión y Debate


2 de noviembre de 2012


 


POLÍTICA Y SUBJETIVIDAD: PERSPECTIVAS, PROYECCIONES Y DESAFÍOS ACTUALES. DISQUISICIONES EN TORNO A LA TEORÍA DE ERNESTO LACLAU”



Esta Jornada se propone como una instancia de reflexión y debate en torno al pensamiento de Ernesto Laclau, particularmente en lo que atañe a problemática de la política y la subjetividad. En este sentido, la apuesta llama a explorar la productividad –en tanto potencialidades y límites- de la obra de Ernesto Laclau para recrear y enriquecer el debate teórico-político al respecto, así como también para repensar las complejas realidades latinoamericanas, en la búsqueda de nuevas herramientas para el análisis político de coyuntura.

La intención de explorar nuevos acervos conceptuales representa un desafío teórico-práctico que no se detiene simplemente en un juego de nociones teóricas, sino que, dicho esfuerzo, apunta hacia la configuración de nuevas matrices de análisis que puedan poner en juego y operacionalizar aquéllas y otras nociones. Es por ello que, procuraremos adentrarnos en la producción laclausiana a la vez que inmiscuirnos en posibles exploraciones teóricas que su obra motiva. Asimismo, emprenderemos un recorrido que transite por las diversas corrientes de pensamiento de las que se nutre su obra de modo que el legado de la Teoría Psicoanalítica, las reapropiaciones que efectúa del campo de la Semiología, así como sus intercambios con otros pensadores contemporáneos post-estructuralistas nos servirán también para ir en pos de estos propósitos.



Con dicho cometido, la Jornada consistiría en el desarrollo de las siguientes actividades:



14.00 hs. “El pensamiento laclausiano: lecturas y relecturas fronterizas”. Mesa de discusión.
16.00 hs. Conferencia-debate a cargo de Ernesto Laclau y Jelica Šumič Riha con la participación especial de Susana Frutos y Pablo Barberis.



segunda-feira, 29 de outubro de 2012

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I Seminário Internacional Sociedade e Fronteiras


                                                                                 A Universidade Federal de Roraima, por meio do Programa de Pós-graduação em Sociedade e Fronteiras, promoverá o “I Seminário Internacional Sociedade e Fronteiras: As Fronteiras da Interdisciplinaridade e a Interdisciplinaridade das Fronteiras”, no período de 04 a 07 de dezembro de 2012, no auditório Prof. Alexandre Borges.

Para submissão de trabalhos no evento, os interessados devem verificar as normas e o formulário disponíveis na página http://ufrr.br/ppgsof/index.php/seminario-internacional.html

Prazos:

Submissão de resumos:  19/10 a 09/11/2012
Divulgação dos trabalhos aceitos: 17/11/2012
Envio de trabalho completo:  21/ a 30/11/2012
Inscrição como expositor e ouvinte 12 a 30/11/2012 e  de 30 a 04/12/2012
Realização do evento: de 4 a 7 de dezembro de 2012

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terça-feira, 23 de outubro de 2012

ENTREVISTA DO PROFESSOR MAURO KOURY À JORNALISTA AMANDA LOURENÇO, JORNAL FOLHA DE SÃO PAULO, CADERNO EQUILÍBRIO, SOBRE AMIZADE NA IDADE ADULTA.

A entrevista abaixo foi dada à jornalista Amanda Lourenço para o Caderno Equilíbrio da Folha de São Paulo, em 18 de setembro de 2012. A matéria onde foi utilizada acaba de sair no Jornal Folha de São Paulo no dia 23 de outubro de 2012, e pode ser vista nos links:

e

Abaixo a entrevista completa:

São Paulo/Recife, 18 de setembro de 2012.

MANDA LOURENÇO - Acabei de falar com você no telefone, sou jornalista da Folha de São Paulo. Estou fazendo uma matéria para o caderno Equilíbrio sobre amizade depois da idade adulta, depois daquela fase de colégio e faculdade, quando o trabalho e a família ocupam a maior parte do nosso tempo. Então eu queria perguntar apenas se você acha que estamos vivendo uma crise de amizade de maneira geral, se as pessoas já não têm tempo pra nada, se elas estão mais egoístas.

MAURO KOURY - Sobre a questão em relação à amizade na idade adulta e se estas pessoas que vivenciam essa fase geracional estão mais egoístas, começo agora a responder: eu acredito que as pessoas nesta faixa etária considerada produtiva, entre 25 a 65 anos, e principalmente aquelas entre 30 a 45 anos, onde a importância da conquista do mercado, de se situarem profissionalmente no mundo do trabalho, da necessidade de buscarem um reconhecimento profissional que as distingam dos demais que com elas concorrem, sofrem bem mais o peso da diferenciação como disputa e reconhecimento. O caminho egoíco, deste modo é latente: é preciso se diferenciar, é preciso concorrer com outros, é preciso superá-los para realização de um projeto pessoal, é preciso não demonstrar fraqueza, nem evidenciar carências e necessidades que possam prejudicar esse projeto, e, se necessário, evidenciar as carências e necessidades dos outros como forma de superá-los e desqualificá-los [jogo não de todo ético, mas conforme às leis do mercado]. Assim, o modo de realização de um se encontra na concentração em si, no foco no seu projeto e nos meios de sua edificação. Os outros só contam quando úteis ao meu projeto: assim, as interações possíveis são medradas pela lógica das alianças e da negociação e da superação dos impasses que os outros impõem ou interpõem os projetos pessoais de um.
 Esse arcabouço acima, bem maniqueísta, por outro lado, se torna uma espécie de plano ideal de comportamento na organização societária para fins de articulação e construção de meios e fins objetivos para inserção e sucesso no mundo do trabalho [que é o mundo profissional visto como o mundo de realização também pessoal na sociedade ocidental capitalista], na realidade, a coisa acontece - como se diz popularmente, - ‘mais em baixo’: a lógica do mercado, a lógica do sucesso, se choca com as carências efetivas e afetivas da necessidade do outro, como ser de compartilhamento com quem se pode abrandar a ‘dureza’ da vida. O que encaminha a pessoa para uma ação ambígua entre o plano ideal de conquista do mundo profissional, que exige um foco em si mesmo e o outro como possível usurpador do seu projeto e do seu lugar profissional, e, ao mesmo tempo, uma necessidade de compartilhamento e de afeto, que ofereça amparo emocional, que se permita ouvir os ais e as alegrias das perdas e das conquistas, que se permita conceder um abraço que alimente e dê forças para a continuidade da vida [encarada como dura e, às vezes, áspera e desesperadora].
Essa ambivalência nos anseios e nas ações leva a duas posições: a mais estudada e enfatizada na literatura que se debruça sobre este tema, desde os fins da segunda guerra mundial e, principalmente, a partir dos anos setenta na Europa e Estados Unidos, e finais da década de oitenta e noventa no Brasil e América Latina, é aquela que leva à solidão dos sujeitos nas sociedades do ocidente que vive sob a égide das formas comportamentais e regras de etiqueta de uma sociedade individualizada e individualista, como a capitalista. Segundo esses analistas, a lógica do mercado colocou como fundamento de sua realização a ideia de que as emoções, o comportamento emocional não é social, é de responsabilidade do sujeito individual e deve ser vivido por ele internamente, de forma contida, i.é, suas ações ‘sociais’ não devem se medrar pelas suas emoções e sim pela razão lógica, que é a razão de mercado. Para estes analistas, agir emocionalmente é uma forma de desqualificação e de seres desqualificados: daí que mulheres e crianças são consideradas nas sociedades ocidentais como criaturas que agem pela emoção, e não são dignas de crédito. O comportamento racional do masculino, pautados pela lógica do espaço público enquanto espaço mercantil e de trocas sociais racionais.
O espaço doméstico, como contraponto ao público, é o espaço da ação emocionalmente ativa, o espaço da irracionalidade vivido pelos sujeitos desqualificados e, aí sim, controlados pela lógica racional e funcional do homem como macho racional produtivo, que trás para dentro do espaço doméstico a organicidade do mundo público e disciplina e equilibra o emocional do espaço doméstico.
 Com a entrada das mulheres no mercado e na disputa de um ‘lugar ao sol’ no mundo das realizações pessoais através do exercício profissional e do sucesso no trabalho, a partir da segunda guerra mundial, i.é, com o esforço de individualização feminina e sua adequação no mundo público, até então dos homens, a lógica racional em detrimento da lógica irracional e emotiva ganha corpo e espaço no mundo público com a qualificação das mulheres como seres racionais, também e principalmente, e com a necessidade de refrear impulsos emocionais nas suas ações e metas. Complicando ainda mais a interação e a possibilidade de amizade, como abertura para o outro, e reforçando a idéia do controle pessoal e do medo do outro como possível algoz à busca pessoal de sucesso de um um. Homens e mulheres assim compartilham dos mesmos medos e da mesma solidão. Ambos se isolam e sofrem a dor do não compartilhamento e vivem em buscas de realização de sonhos profissionais que nunca são satisfeitos, e perseguidos melancolicamente como forma de preencher um vazio de algo perdido [não se sabe aonde e nem o que e nem o porquê] sem retorno, a não ser ampliar a solidão pessoal e reforçar a lógica do mercado e angustiar-se de uma ânsia de compartilhamento que não mais se sabe como fazer e como agir para tal.
O homem egoíco, assim, dessas sociedades, é assim, visto como um ser em solidão, um ser angustiado de nunca estar satisfeito com o que consegue no plano material e, ao mesmo tempo, um ser que anseia em ser descoberto, ser acarinhado e compreendido, mas quando encontra alguém nesse sentido se fecha com medo de ser esse outro um algoz possível... O que refreia os canais comunicantes possíveis a amizade, já que a mesma é medrada pela ação emocional de confiança mútua [a traição é antecipada, e por isso, o medo do encontro, embora ansiado]. Daí a depressão como doença do século XXI, como consequência dessa ambivalência em que o homem ocidental e brasileiro se move, ampliando a solidão e a dificuldade de relacionar-se amigavelmente, e através da disputa por um sucesso cada vez mais efêmero e que nunca satisfaz, mas que o faz correr sempre atrás, sempre atrás, sem retorno possível e sem esperança... Daí a patologização da angustia e melancolia, transformada em depressão e apelos suicidas.
 O segundo movimento interpretativo se dá no âmbito do feminismo e da busca de recuperar as emoções como um elemento essencial à organização social e cultural. Nesse movimento busca-se, como Foucault, recuperar a amizade em seu sentido mais político de reorganização de um mundo comum onde o compartilhamento e o afeto sejam o elemento de proa enquanto troca solidária entre os indivíduos. Ou como o movimento feminista, que desde os anos setenta denuncia a desqualificação do espaço emotivo pela sociedade contemporânea ocidental, como forma de hierarquização dos seres humanos [leia-se entre homens e mulheres], desqualificando as mulheres, como emotivas, e qualificando os homens como racionais. Esse movimento desencadeia uma crítica à lógica organizacional da sociedade individualista e busca levantar a bandeira das emoções como um elemento capaz de reconstruir as teias deste mundo comum, do espaço público enquanto espaço de negociação e compartilhamento, perdido no processo de desenvolvimento da sociedade capitalista. Mas ainda titubeia quanto a espaços organizacionais, e vez ou outra cai ou fica no espaço de denúncia do processo de hierarquização entre os sexos.
Por fim, gostaria de lembrar que estudos recentes que trabalham com o envelhecimento, na sociedade ocidental e no Brasil, têm apontado para uma saída encontrada por indivíduos, homens e mulheres, após os cinquenta e cinco e principalmente entre os de sessenta e cinco anos ou mais, em relação ao compartilhamento e busca de amizades, como forma de sanar a solidão e o sofrimento pela exclusão social sofrida no processo de envelhecimento e saída do mercado. Esse processo é apontado, principalmente, entre aqueles sujeitos, homens ou mulheres, que chegam à velhice sem companheiros/as ou filhos, ou que enviuvaram. Nos espaços societários disponíveis para a circulação de velhos eles encontram formas de vencerem os espaços de contenção e disciplina pessoal e têm conseguido romper barreiras em relação aos outros estabelecendo relações de amizade e compartilhamento de interesses e afetos. O que é de fato um elemento novo de grande interesse para a antropologia e para a sociologia das emoções, em que milito profissionalmente.

 Dados sobre o autor. Mauro Guilherme Pinheiro Koury: Antropólogo, professor do Programa de Pós-Graduação em Antropologia e do Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos da Universidade Federal da Paraíba e continuo coordenador do GREM – Grupo de Pesquisa em Antropologia e Sociologia das Emoções.hospedagem de sites gratis html




segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Retratos sociológicos: Disposições e variações individuais



                                                                                   Por:Joelma Santos da Silva *


No trabalho intitulado “Retratos sociológicos: Disposições e variações individuais”, Bernard Lahire apresenta as bases teóricas, métodos e problemas encontrados na pesquisa sociológica em que faz o que chama de sociologia experimental, utilizando as noções da tradição disposicional, como disposição, inclinação, hábito e tendência.
A tradição disposicional, seus conceitos, idéias e questões que ela suscita, não apresentam em si ineditismo na sociologia, mas Lahire propõe um novo uso dessas idéias, um método diferenciado na sua aplicação, com profundo comprometimento com a pesquisa empírica e controle consciente dos problemas, limitações e aplicabilidade dos resultados obtidos, enfocando uma reflexividade sobre o aporte teórico e metodológico como criador da perspectiva de análise do objeto, e de criador deste, aplica um método novo que consiste em entrevistas sobre diferentes espaços e ações da vida social aplicadas ao mesmo entrevistado, sendo chamado de sociologia experimental pelo seu caráter inventivo e variante dos procedimentos de pesquisa ditos tradicionais.
Apresenta seu trabalho de pesquisa como um retorno crítico aos instrumentais usados nas analises disposicionais, não aderindo ao princípio do passado determinante da ação dos indivíduos ou da total consciência que este teria de suas ações. Indica um caminho que se utiliza do princípio da não-consciência, mas que não despreza a fala destes, que o considera conscientes de suas ações, mas não dos dispositivos que levam até ela, propondo uma interpretação que tem como objeto não somente a sua fala, mais também o seu comportamento, as representações que este cria de suas práticas, numa perspectiva de comprometimento com a pesquisa empírica, a racionalidade científica e que valoriza a interpretação sociológica do autor, pois sem isso os estudos se reduziriam “aos objetos designados pelos atores sociais” (p. 24), onde estes teriam o papel de validar as interpretações sobre si.
As condições pelas quais as disposições apresentam-se, relação com a trajetória individual e contexto em que são ativadas, são formas interpretativas colocadas pelo autor como uma maneira de passar de uma simples idéia sociológica usada indevidamente para o uso reflexivo do esquema interpretativo que esta idéia propõe. Visando destacar as variações individuais das disposições de acordo com o percurso biográfico, em relação aos diversos contextos sociais que o ator transita, a pesquisa enfocou três pontos principais.
O primeiro é relativo ao tamanho e variação de universos, formas de contextos e indivíduos com princípios de socialização diferenciados aos quais o ator foi exposto em seu percurso biográfico. O segundo diz respeito a variação das disposições individuais em função do momento e do contexto. O terceiro é relativo aos momentos de crise, que Lahire destaca como reveladores de “contradições ou defasagens entre as disposições do pesquisado e as requeridas por uma situação [...]” (p. 27), assim como da assimilação de novas disposições, ajustes e confrontos das antigas.
A disposição, no entanto, é colocada como algo não observável diretamente, mas interpretado a partir do comportamento apresentado, tentando desvelar quais são as geradoras da prática ao mesmo tempo em que estas práticas também são indicadoras das disposições. Seu uso pressupõe uma relação com uma série de outros aportes teóricos e metodológicos, que o pesquisador deve considerar para ser consciente das limitações desse conceito e sua aplicação durante a investigação proposta.
A primeira limitação indicada diz respeito à gênese da disposição, da situação de sua produção e incorporação; a segunda é o da recorrência e coerência de uma série de práticas e comportamentos que podem ser observáveis, e estas só podem ser observadas porque são incorporadas, de diferentes formas e intensidades, através de experiências semelhantes que solicitam aquela determinada disposição.
Na procura pela coerência das práticas, o pesquisador deve atentar para os contextos em que as disposições determinadas são acionadas, se são específicas a essas situações ou gerais e como transitam em contextos diferentes, as chamadas “circunstâncias de sua aplicação”.
Lahire também destaca em sua pesquisa o caráter de flexibilização das disposições, suas possibilidades de inibição e transformação das situações diversas e a necessidade conceitual de não serem confundidas com competências, ou associadas a outros condicionantes como gosto ou indiferença. Outro elemento colocado em relação a esse tipo de pesquisa são os tipos de arranjos entre as diversas disposições de um indivíduo, de que forma se dão e se organizam, problemas que coloca como possíveis de serem respondidos somente através da investigação empírica.
Apresentadas estas questões quanto à teoria que norteia a pesquisa, é explicado o método aplicado, que consistiu na aplicação de seis diferentes pesquisas a oito entrevistados, aplicadas pelo mesmo pesquisador, sobre seus sentimentos e ações em diferentes práticas e contextos, fornecendo informações variadas sobre um mesmo indivíduo, como também sobre o local e contexto em que se desenvolveu a entrevista, defendendo a idéia de que

Só um dispositivo metodológico desse tipo permitiria julgar em que medida algumas disposições sociais são ou não transferíveis de uma situação para outra e avaliar o grau de heterogeneidade ou homogeneidade do patrimônio de disposições incorporadas pelos atores durante suas socializações anteriores (p. 32).  

Um aspecto crucial desse tipo de pesquisa foi a escolha dos entrevistados, que se deu com base no tempo livre destes e aceitação de se submeter às entrevistas, como também  a relação de proximidade e distanciamento estes com o pesquisador, que deve ser balanceada para evitar uma familiaridade excessiva ou um total estranhamento, ambos extremos que prejudicariam a pesquisa, o que o autor tentou sanar através da escolha de pessoas que possuíam ligações indiretas e ocasionais com os pesquisadores ou pessoas a eles ligadas, que fossem adultas e tivessem inserção na vida profissional, familiar e escolar.
O aspecto enfocado para a pesquisa foi o de crise nas trajetórias dos entrevistados, pois pressupôs-se que nestes momentos as disposições são movimentadas – ativadas ou reativadas, o que favoreceria o objetivo de verificação da aplicabilidade da teoria disposicional em relação aos diversos contextos, situações e diferenciações do mundo social.
Quanto à construção das entrevistas, o autor explicita os pressupostos teóricos utilizados nos informando que foram inicialmente divididos seis “universos de socialização” considerados como bases dos processos de socialização do indivíduo, tentando compreender os efeitos destas para o entrevistado, porém, estes universos não são autônomos na prática social, eles se entrelaçam e os entrevistados explicitam isso em suas respostas, sendo que outra parte das perguntas avaliava o nível de autonomização e interpenetração destes.
Por ser uma pesquisa que se utiliza de entrevistas de caráter biográfico, que visou captar os aspectos diacrônicos e sincrônicos das variações das disposições dos indivíduos, bem como a própria gênese destas, Lahire nos fala do cuidado que foi necessário para o pesquisador não acabar com a equivalência entre os contextos proposta pela entrevista, destacando por si contextos e indivíduos importantes para o entrevistado, ou apagando contradições, mas pelo contrário, ver no destaque dado pelo entrevistado a situações, pessoas ou problemas, possibilidades de enriquecimento da pesquisa, quando da interpretação dos dados coletados.
Parte das perguntas que constitui a grade de entrevistas estuda disposições específicas com o objetivo de “[...] evidenciar o grau de extensão de sua ativação, os contextos de sua aplicação e os de seu eventual estado de vigília.” (p.40), relacionando a outra parte que tentou verificar se e como o entrevistado aplicava essas disposições.
A sociabilidade ocupa um lugar de destaque na grade de entrevistas, pois analisando a maneira pela qual ela se realiza foi tentado apreender de “gosto e inclinação” dos indivíduos pesquisados. Outra questão levantada foi a das causas de inibição de algumas disposições, crises, frustrações, atritos, contextuais ou desencadeados nas relações de sociabilidade.
Finalizando a apresentação que o autor faz dos métodos e problemáticas dessa proposta de sociologia experimental, as perguntas das entrevistas objetivavam, por um lado, especificar os contextos e pessoas que agiram com o tipo de prática desempenhada e, por outro, com os vários exemplos apresentados, suscitando uma vasta e diversa gama de experiências, destacando nessa relação os diversos aspectos divergentes levantados como enriquecedores da pesquisa, ao longo desse processo de criação do objeto na pesquisa.   

Referência: LAHIRE, Bernard. Retratos sociológicos: Disposições e variações individuais. Porto Alegre: Artmed, 2004, p. 19-44.
*Graduada em História pela Universidade Federal do Maranhão, mestre em Ciências Sociais da mesma instituição. Possui experiência profissional nas áreas de ensino e pesquisa em História, Paleografia, monitoramento de visitas em espaços museográficos, atividades administrativas e pesquisas governamentais. Desenvolve pesquisas atualmente nas aréas de História das Religiões e Sociologia Histórica. Professora de Teorias da História / Introdução à Pesquisa Histórica do Programa Darcy Ribeiro da Universidade Estadual do Maranhão e professora substituta de história no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão.

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I Seminário de Pesquisa em História


O Curso de História e o Núcleo de Pesquisa em História da Universidade Federal de Roraima (UFRR) convida a comunidade em geral para participar do I Seminário de Pesquisa em História, Fontes Textuais e Arquivos em Roraima: Possibilidades e Dificuldades. O evento ocorre no dia 24 de outubro, 18h30, no auditório do Centro de Ciências Humanas CCH/UFRR.

O seminário tem como objetivo debater as metodologias utilizadas na pesquisa em história e divulgar os arquivos abertos a pesquisadores no estado de Roraima.



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sábado, 20 de outubro de 2012

Solidariedade

Acordei pensando...

Que não agimos apenas por nosso desejo
 

Que sempre fazemos as coisas pensando em outros...
 

Que nossas ações só existem em relação a nossa família, vizinhança, cidade
 

Que essas ações, de espírito coletivo, geram solidariedade
 

Que quanto mais amor e relações existirem, mais coletivas serão nossas ações
 

Que os desejos ocultos e egoístas camuflam a infelicidade de quem é incapaz de pensar no coletivo


Marmanillo 20/10/2012

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